terça-feira, 12 de maio de 2009

Esta é uma entrevista do Dr. Dráuzio Varella com o médico infectologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, Esper Kallás.
Onde surgiu o vírus da AIDS?
Estudo realizado nos Estados Unidos baseou-se na análise das características genéticas do vírus HIV isolado em várias regiões do mundo para traçar o local onde a epidemia teria surgido. Essas seqüências genéticas foram colocadas num grande computador que, utilizando programas matemáticos complexos, mapeou a evolução do vírus, estabelecendo as modificações adquiridas e sua adaptação às diversas regiões em que foi identificado no planeta. Esse e outros estudos sugerem que a epidemia tenha surgido de fato no centro da África, numa região abaixo do deserto do Saara onde o vírus, antes encontrado somente em chimpanzés, foi transmitido para os humanos através de contato ocasional entre esses animais e os homens.
Existem teorias fantasiosas de que o homem teria adquirido o vírus através do contato sexual com chimpanzés. O que realmente aconteceu?
Esse estudo americano foi muito cuidadoso e investigou os costumes do povo que habitava a região da África na qual o vírus teria surgido. Os pesquisadores observaram que, em alguns lugares, as pessoas viviam em tribos afastadas da civilização e tinham o hábito de caçar chimpanzés. Muitas vezes, esses animais eram mortos e esquartejados no local onde eram abatidos. Há fotos de pessoas manipulando os macacos mortos, cobertas de sangue até os ombros. Elas mexiam nas vísceras, cortavam a carne em pedaços e os levavam para serem comercializados nos mercados onde outras pessoas podiam entrar contato com o sangue. Por outro lado, é fácil imaginar que esses caçadores, andando dentro da mata ou lidando com o animal, podiam machucar-se, ferir-se e serem infectados pelo vírus dos chimpanzés. Desse primeiro contágio até a epidemia avassaladora que se espalhou pela África provavelmente decorreram décadas. Estima-se, no entanto, que mais de quinze milhões de africanos já morreram infectados pelo HIV. É uma grande tragédia. Em relação à disseminação do vírus entre os chimpanzés, é importante ressaltar dois pontos. Primeiro, é que a infecção pelo HIV não provoca doença no animal. Segundo, não existe um estudo para demonstrar quantos chimpanzés estariam infectados por esse tipo de vírus. Pode ser que essa infecção fosse muito comum entre eles. Há um estudo a respeito do assunto em andamento. Os dados preliminares, apresentados em fevereiro de 2002, indicam a dificuldade de obter essas amostras, porque os chimpanzés estão soltos na natureza e há a preocupação em não interferir no ecossistema desses animais. Por isso, foram desenvolvidos métodos para vencer esses obstáculos. Os pesquisadores coletam fezes e urina dos animais e aplicam o teste para verificar a presença do vírus. O problema, todavia, é que com o avanço da urbanização na região diminuiu muito a população de chimpanzés que hoje vive confinada em pequenos nichos, pequenas comunidades nas quais se procura preservá-los. Conseqüentemente, a população atual é muito menor do que era há 30 ou 40 anos.
O vírus da AIDS sofre mutações genéticas com facilidade. Talvez, das viroses que provocam infecção humana, seja a mais mutante de que se tem notícia. Que diferenças genéticas apresentam o vírus que caminhou na África, passou pela Europa e América do Norte e chegou até nós?
Quanto mais o tempo passa, mais aumentam as diferenças. Investigando o vírus no centro-africano, berço da epidemia de AIDS, observa-se que ele apresenta enorme diversidade genética resultante das modificações que vem sofrendo há mais tempo, já que foi ali que apareceu primeiro. Nos Estados Unidos, América do Norte, leste da Ásia e Brasil, a epidemia é mais recente e surgiu mais ou menos na mesma época. Como conseqüência, os vírus são muito parecidos entre si. Atualmente, segundo convenções genéticas e científicas, esses vírus são classificados por letras. Nos Estados Unidos, predomina o tipo B; no Brasil, também há mais o do tipo B, mas os tipos F e C começam a proliferar no nosso país. Na África, encontram-se todos os tipos que se conhece. No leste asiático predomina o tipo A, ou melhor, um híbrido de A com E. Só para chamar a atenção, devemos diferenciar essa classificação de um segundo tipo de vírus que é o HIV II, transmitido ao ser humano por outra espécie de macaco. É uma doença de evolução mais lenta do que a do HIV I e a epidemia está restrita à África.
Um estudo realizado com as prostitutas do Senegal identificou um subgrupo de mulheres altamente expostas à infecção que não contraíram a doença. Como se explica o fato de essas mulheres serem imunes ao vírus?
Nesse estudo, foram pesquisados os locais onde há grande disseminação do vírus, por exemplo, o centro africano. A epidemia ali é avassaladora. Para ter-se uma idéia, de 1995 até 2000, a expectativa de vida da população caiu doze anos. Existem algumas regiões em que mais da metade da população adulta tem o vírus. É uma tragédia epidemiológica. As pessoas não têm acesso ao tratamento e os cuidados com a saúde são precários. Na seqüência dos trabalhos, constatou-se que havia alguns grupos nos quais a incidência da infecção era ainda maior. As prostitutas, por exemplo, em determinados lugares, tinham uma atividade sexual tão intensa que seria impossível imaginar que não pegassem o vírus. Na verdade, a esmagadora maioria dessas mulheres estava infectada pelo HIV, mas um pequeno porcentual delas não tinha sido contaminado. Seria sorte, já que vinham praticando sexo sem proteção com múltiplos parceiros, todos os dias e durante muitos anos? Não, essas mulheres têm alguma coisa especial. O que é não se sabe. Fato semelhante pode ser observado em certos casais em que um dos membros é soropositivo sem que o outro saiba. Durante muitos anos, eles mantêm relações sexuais sem a precaução necessária e o vírus não é transmitido para parceiro saudável. Alguma coisa deve explicar isso. Talvez seja a constituição genética ou o desenvolvimento de uma resposta imunológica mais eficaz ou ainda um vírus menos agressivo e por isso incapaz de transmitir-se facilmente.
Você falou de pessoas casadas com parceiros infectados que, após muitos anos de relacionamento sexual, não foram contaminadas. Para mim, elas desenvolveram algum tipo especial de resistência, porque sem dúvida entraram em contato com o vírus. Agora, vamos pegar o oposto, aquelas que se infectam logo no início de um relacionamento sexual com um portador do HIV. Quais as pessoas que além de constituição genética desfavorável apresentam condições clínicas que favorecem a infecção? Há algumas variações genéticas, denominadas mutações, que facilitam a multiplicação do vírus e sua ação deletéria mais rápida. Em certas pessoas mais protegidas, o vírus encontra maior dificuldade para penetrar na célula. Noutras, esse obstáculo desaparece. Alguns vírus apresentam maior facilidade de serem transmitidos. São mais agressivos. Quem entra em contato com eles, sai em desvantagem. Por outro lado, num relacionamento sexual, contam muito as condições em se encontra a superfície dos órgãos genitais. Se a mucosa dos parceiros estiver saudável, a transmissão do vírus será mais difícil se comparada com outra que tenha uma ferida. Várias doenças sexualmente transmissíveis, como herpes, cancro mole ou sífilis, produzem feridas na superfície dos órgãos genitais que aumentam a probabilidade de transmissão do HIV. Outro fator importante na transmissão do vírus é o sexo anal. Primeiro, porque o ânus e o reto não foram concebidos para o relacionamento sexual, uma vez que sua superfície é muito fina e frágil o que favorece o aparecimento de lesões e a transmissão do vírus. Além disso, é preciso considerar as condições imunológicas do indivíduo. Se estiver enfraquecido, não se cuida direito ou tem um problema qualquer de saúde, o risco de infectar-se aumenta e a evolução da doença será mais rápida.
No começo da epidemia, dizia-se que nós, no Brasil, poderíamos chegar à situação da África. Você acha que ainda corremos esse risco?
Acho essa afirmação exagerada. Na África, a epidemia adquiriu proporções inacreditáveis por causa das condições desfavoráveis de prevenção e tratamento. No Brasil, o combate à epidemia está sendo muito mais agressivo do que em qualquer outro país em desenvolvimento. Não se pode desconsiderar o empenho do Ministério da Saúde e das organizações não governamentais não só para evitar o alastramento da epidemia, como para tratar os infectados. Portanto, nossa situação é muito diferente da que se verifica em alguns países africanos. Não que ela deixe de ser preocupante. Nada justifica que se baixe a guarda nem que seja por instantes.
Em 1988, na Conferência Internacional de AIDS, na Suécia, falava-se que a AIDS estava batendo às portas da Ásia. Hoje a AIDS é um caso de calamidade pública em certos países asiáticos, como a Índia, por exemplo.
O tempo mostrou que ela não só bateu, mas chutou a porta e entrou correndo. Apesar de a África ter o maior contingente de infectados, na Ásia o crescimento da epidemia é muito mais rápido. Países como a Tailândia, a Índia e até mesmo a China estão sofrendo um processo de contaminação pelo HIV que em alguns anos pode transformar-se numa enorme tragédia. Aparentemente, o problema é mais grave na Índia, mas não se conhece bem a evolução da epidemia na China, onde a doença se espalha com grande velocidade.

Perguntas frequentes:


Beijo na boca passa AIDS? O beijo nunca foi estabelecido como forma de infecção pelo HIV. O que pode preocupar são sangramentos que a pessoa soropositiva por ventura tiver na gengiva. Feridas secas não conseguem transmitir o vírus.
E a saliva? A quantidade de HIV na saliva é muito pequena e, além disso, nela existem várias enzimas que protegem a boca de uma possível contaminação. Só há perigo de contaminação pelo HIV caso as duas pessoas tenham péssima higiene oral e sangramentos constantes na boca. Uma pessoa que tem cuidados básicos com sua boca e costuma ir ao dentista não tem como transmitir o HIV através do beijo.
Qual o perigo de se praticar sexo oral com uma pessoa contaminada pelo HIV? No sexo oral, a pessoa ativa não transmite o HIV porque não é possível transmiti-lo através da saliva. Já quem recebe a ejaculação de uma pessoa soropositiva na boca corre o sério risco de se contaminar. A secreção que sai do pênis antes da ejaculação, por ser em pouca quantidade e conter um número menor de vírus, dificilmente são capaz de contaminar alguém. O ideal é usar preservativo também durante o sexo oral. Caso contrário, não se estenda por muito tempo nesta prática. Use-a apenas como preliminar. Desse modo, o risco de contaminação torna-se menor. Quando a mulher soropositiva recebe o sexo oral, a probabilidade de o parceiro ser contaminado é menor, pois a secreção feminina apresenta menos quantidade de vírus do que a ejaculação masculina. No entanto, durante ou próximo ao período menstrual, deve-se evitar essa prática, pois o risco aumenta muito. O problema maior para quem pratica o sexo oral é pegar outras doenças venéreas, como sífilis, gonorréia ou herpes. Se houver feridas no pênis, o risco de transmitir o HIV é maior. Praticar sexo oral implica correr algum risco, mas você diminui esse risco se evitar a ejaculação na boca, contato com feridas no pênis ou na vagina e contato durante ou próximo ao período menstrual.
O sangue contaminado pelo HIV entra em contato com outra pessoa. Qual o perigo nesse caso? É muito pouco provável que aconteça o contagio em uma situação como essa. Se a pele da pessoa que não é soropositiva estiver íntegra, ela funciona como uma barreira eficaz contra o HIV. Mas entrar em contato com o sangue de outra pessoa nunca é bom, soropositiva ou não. A possibilidade de contrair outras doenças como hepatite, por exemplo, é muito maior. Existem diversos tipos de microrganismos presentes na corrente sanguínea que são transmissíveis pelo sangue. As pessoas fantasiam muito com a forma de contaminação. Ninguém se contamina por encostar-se em sangue com HIV. O vírus da AIDS precisa entrar na corrente sanguínea para contaminar alguém. Ou seja, para haver contaminação seria necessária uma grande quantidade de sangue caindo em cima de um corte profundo.

Como Prevenir?
USAR CAMISINHA!
Reduzir ao máximo o número de parceiros sexuais. Quanto maior o número, maior a possibilidade de pegar AIDS. A igreja recomenda a castidade antes e a fidelidade no casamento como única prevenção. Se não concordar com as exigências da moral cristã e tiver um ou mais parceiros sexuais, é aconselhável usar camisinhas. NÃO USAR DROGAS Em caso de uso, usar seringas descartáveis Quando receber transfusão de sangue certificar-se de que o sangue tenha sido previamente testado para detectar o vírus da AIDS.

Onde não se pega AIDS:


Na piscina
No ônibus
No beijo social
Em visitas aos hospitais
Nos talheres
No sanitário
Na convivência social
Na picada de inseto
No assento

Gabriela Viana

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